INDEPENDÊNCIA COMO INDIFERENÇA: A FACE JURÍDICA DA MULTIPLICIDADE INSTITUCIONAL EM CASOS DE CORRUPÇÃO

Maira Rocha Machado

Resumo


Este texto discute a multiplicidade institucional no campo da corrupção com base em um exercício de categorização das normas que regulam a interação entre diferentes áreas do direito (civil, penal e administrativa). O objetivo é identificar quais são e como estão formuladas as normas que se referem a outras possibilidades de responsabilizar e sancionar uma mesma conduta. Partindo do referencial teórico desenvolvido por Álvaro Pires para descrever normas penais, o texto busca expandir seu alcance para contemplar o conjunto da atividade sancionatória estatal. Conjuga-se a este exercício o modo como a doutrina trata a questão por intermédio do princípio “ne bis in idem” e da “independências das esferas”. A pesquisa permitiu identificar normas com conteúdos muito distintos e zonas de interface entre áreas jurídicas sem regulamentação explícita. Combinado com a sistematização doutrinária, o quadro normativo permitiu associar a ideia de “independência das esferas” com uma postura de indiferença em relação às outras áreas. Para concluir, o texto aponta que a ampliação do alcance da ideia de ne bis in idem para o conjunto da atuação sancionatória estatal desafia esta independência como indiferença, abrindo espaço de reflexão e reconstrução jurídica no âmbito da atividade legislativa e da atuação jurisdicional.

Palavras-chave


princípio da independência das esferas; ne bis in idem; corrupção; Lei de Improbidade Administrativa; Lei Anticorrupção; Estatuto do Servidor Público Federal

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DOI: 10.17808/des.55.965

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